quarta-feira, novembro 16, 2005

Um mês...

“Um mês de vida. Tenho um mês de vida.” As lágrimas escorrem-me pela face enquanto penso nisto. A incerteza do diagnóstico passou, tornou-se precisa e a notícia atinge-me com a rapidez de uma bala.
Saio do hospital. Não me apetece falar com ninguém. A mensagem tranquilizadora é mandada aos pais: “Saí agora... não vou já para casa, depois falamos, ok? Não se preocupem! Beijo”. Enfio-me no primeiro táxi que vejo e digo apenas “para a Expo!”. Não reparo no caminho, vou demasiado absorvida nos meus pensamentos para tal. Ao chegar, dirijo-me automaticamente para “aquele” local, à beira Tejo. “Aquele” meu local, que partilhei apenas com amigos, em dias mais felizes... o local ponto-de-encontro antes de uma noite de borga, o local de conversas fora de horas ao frio da noite, o local de sessões fotográficas, o local de partilha... Aqui, penso em toda a minha vida, relembro o que fiz, o que nunca fiz por não ter coragem, quem ficou para trás e se perdeu no caminho da vida, quem seguiu por rumos diferentes, quem ainda está presente e me acompanha... relembro todos os momentos, bons e maus, brincadeiras, diversões, tristezas e angústias... E choro, choro até me sentir leve, até conseguir erguer a cabeça e pensar no que vou fazer. Tenho vinte anos, planos para o futuro e apenas 30 dias para viver! Mentir está fora de hipótese! Mas dizer a verdade!? Não quero, não posso... como dizer a alguém que vou morrer!? “Olha, sabes, afinal somos como os iogurtes e o meu prazo de validade expirou!”
Temo pelos meus pais, pelo meu irmão... a notícia será um choque, tal como foi para mim! Neste momento, surge-me a questão “contar ou não contar?”... só a eles?!... Não sei!... Quanto aos restantes, não quero que se lembrem de mim como “a coitadinha”... se nunca o fui, porquê ser agora?! Vou viver a minha vida normal, vou fazendo despedidas, sem deixar (ou pelo menos tentar) que o outro não se aperceba que realmente é uma despedida... mas... não! Não vou fazer a minha vida normal. Em função dos meus objectivos, do meu curso, abdiquei muito do meu tempo mas agora não, não o vou fazer!
Vou-me baldar, a estágio, aulas, ao que for! Vou aproveitar o meu tempo a fazer o que quero, passar mais tempo em casa com os meus pais, ler os livros que não li, ter tempo para mim, aceitar os convites que me fazem (pequenos-almoços, jantares, ir às compras ou a um bar, cineminha com os amigos, idas a Coimbra (Faro ou Covilhã!), peças de teatro, cafézinhos, LUXar toda a noite ou um simples passeio apenas... seja o que for! E não voltarei a ter dizer “lamento, mas estou atolada com os estudos” e deixarei de ver o desalento na cara dos outros, após repetições de uma verdade que soa a desculpa).
E, por momentos, páro. Deixo de pensar em mim e apenas fito o rio à minha frente, e as suas calmas ondulações sossegam-me... Olho a paisagem à minha volta. O sol põe-se, pintando o céu de alaranjado. Ao longe vejo nos bancos pares de namorados que aproveitam o momento, vejo as pessoas que passam apressadas, vejo um casal de meia-idade que anda vagarosamente de mão dada, apreciando a paisagem, o momento, apreciando-se mutuamente. E fico triste... sempre tive consciência da morte e a minha morte não me assusta, mas sei que esta morte - a minha - será sinónimo de uma profunda tristeza em três pilares da minha vida. Sei que vou morrer um dia, só nunca pensei que fosse agora... agora não, é cedo demais! Há tanto que fica por fazer... Tenho saudades dos beijos que não dei, da língua que não provei, dos abraços que ficaram por acontecer, do riso que não foi partilhado, do apoio, da amizade, do carinho... tenho saudades dos meus sonhos, e do que agora sei que não irá acontecer...
Vou dar um beijo aos meus pais, adormecer e não acordar... E por isso antes vou escrever. Na minha arca deixarei o meu “testamento” a todos os que me marcaram: uma mensagem minha, escrita só para essa pessoa, com uma fotografia nossa e um abraço bem apertado! Uma lembrança apenas, para quando a memória falhar...


(TPC de 15 de Novembro: é-te dito "tens uma doença terminal e tens 30 dias de vida". Reflecte e diz como vais passar, como te vais sentir e com quem queres partilhar tudo.)

3 Comments:

Blogger BrunoS said...

Tu sabes como terminar os textos. É isso que me falta sempre!
hum...

E claro, já sei qual seria a foto.
beijo.

17/11/05 01:02  
Anonymous Anónimo said...

Mana cúcú..só tenho 1coisa a dizer-te: "TU TÁS VIVA!!" lolol E eu mal ou bem, RECOMENDO-TE :p a tua monga *

3/2/06 00:05  
Anonymous Anónimo said...

este fez-me chorar. tenho mts saudades tuas. a tua Jo

21/2/06 21:54  

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